data-filename="retriever" style="width: 100%;">"A cada dia que passa, fica mais claro que o que está acontecendo não é um impeachment, mas um golpe para tirar o poder da população e do voto". Quem disse esta frase? Acertou quem apostou em Trump. Errou quem pensou que fosse Dilma Rousseff. O presidente dos Estados Unidos se tornou o terceiro presidente do país a ter um impeachment aprovado pela Câmara dos Deputados. Não vai dar em nada. Lá, ao contrário daqui, parece haver mais respeito pelo voto do povo.
Trump é acusado de abuso do poder e obstrução do Congresso. Especificamente, Trump teria constrangido o governo da Ucrânia a anunciar uma investigação contra um opositor político, em troca de ajuda militar ao país. Ele teria pedido ao presidente da Ucrânia que investigasse o adversário democrata Joe Biden e seu filho, além de ter tentado atrapalhar o inquérito sobre sua conduta. Um pedido de impeachment pelo uso do poder para alcançar objetivos pessoais.
E Dilma, do que foi acusada? Aposto que grande parte do povo brasileiro ainda tem dúvida sobre os motivos que levaram Dilma à perda do mandato. Mas uma coisa é certa: não foi por razões pessoais. No dia do impeachment (12/05/2016), o próprio The New York Times destacava em editorial o seguinte: "Embora seja discutível dizer se Dilma cometeu algum tipo de crime, não há evidências de que ela abusou do poder para ganho próprio".
Oficialmente, Dilma foi acusada de descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), por editar decretos de crédito suplementar em 2015 sem autorização do Congresso e por atrasar pagamentos de benefícios sociais aos bancos públicos - procedimento que ficou conhecido como "pedaladas fiscais". O crime seria, portanto, a tentativa de camuflar a verdadeira situação fiscal do país. Essa prática, aliás, era comum nos governos anteriores, mas o Tribunal de Contas da União (TCU), no caso de Dilma, achou que era motivo suficiente para impeachment. Será que era?
Aliás, voltando a comparar os dois impeachments, existe um precedente em que o governo dos Estados Unidos, em certa ocasião, adiou o pagamento de benefícios do seu sistema de saúde para o ano seguinte. No caso brasileiro, das "pedaladas fiscais", ao invés de atrasar o pagamento aos beneficiários, o governo adiou o pagamento aos bancos públicos, embora estes tenham pago os benefícios em dia. A lógica perversa é esta: não é crime a população financiar o governo enquanto não recebe os seus benefícios; mas é crime um banco público realizar operações de crédito para o próprio governo!
A LRF não diz quantas "pedaladas" caracterizam um crime, ou seja, quantos dias de atraso no repasse aos bancos públicos caracterizam uma operação de crédito? Mas o TCU julgou que, em 2014, pela primeira vez, os dias de déficit e o volume de atrasos foram grande o suficiente para serem interpretados como empréstimo. Uma questão até certo ponto subjetiva, já que não havia precedente para comparação. Sem contar que esses fatos são anteriores ao segundo mandato da Dilma.
O caso da abertura de seis decretos de créditos suplementares em 2015 também é discutível. Esses decretos não aumentaram o total de despesa que poderia ser executado por cada órgão, apenas permitiram a realocação interna de recursos compensados através do cancelamento de outras dotações orçamentárias. O TCU julgou, de forma casuística, que esses valores foram incompatíveis com a meta fiscal. Tanto é verdade que, dois dias após o impeachment da Dilma, o Senado aprovou uma lei que dobrou o limite para abertura de créditos suplementares sem necessidade de aprovação do Congresso.
Você pode ter muitas razões para não gostar da Dilma, mas as razões econômicas alegadas para o seu impeachment "desmancham no ar".